O padre Dario Bossi, missionário comboniano italiano, explica em vídeo o documento de trabalho que guiará o Sínodo para a Amazónia.
Neste vídeo, o sacerdote fala sobre o segundo capítulo do documento, que trata do tema “O clamor da terra e dos pobres”.
O missionário acompanhará de perto os trabalhos do próximo Sínodo para a Amazónia, que se realizará de 6 a 27 de outubro de 2019, no Vaticano.
«Nossa aldeia estava na região de Tucuruí. A empresa queria negociar connosco, para que a gente saísse logo de nossa terra. A hidroelétrica não podia esperar. Também o Estado fazia pressão.
Nosso cacique Payaré foi o último que deixou a terra, quando já estava sendo inundada.
Nos trouxeram aqui, a mais de 200 km de distância, numa terra diferente.
Logo, nossa nova terra foi atravessada pelos trilhos da Vale, que exporta dinheiro. Em seguida, pelo linhão de energia.
E agora, ameaçam construir uma nova hidroelétrica, em Marabá. Não vamos deixar que de novo nossa terra Mãe Maria seja alagada!»
São as palavras do povo Akrãtikatege, que está a ser vítima por quatro vezes seguidas do tal de “desenvolvimento”.
No país há muitas destas “zonas de sacrifício”: territórios, e populações, que precisam se sacrificar para que avance o chamado progresso.
O segundo capítulo do Instrumento de Trabalho para o Sínodo da Amazónia trata exatamente do “clamor da terra e dos pobres”.
Diz que estão a acontecer “atentados conta a vida no território amazónico”.
Imaginem: ao longo de sete meses, foram diretamente escutadas mais de 80 mil pessoas, nas comunidades rurais, urbanas, fluviais e da floresta nos nove países da pan-amazónia.
O clamor das pessoas e da Mãe Terra ressoa muito forte no coração da Igreja, quando ela se põe à escuta: a destruição extrativista, as ameaças aos povos indígenas em isolamento voluntário, a migração, os desafios da urbanização, da saúde e educação integral, a corrupção, a situação das famílias...
O documento aprofunda cada um destes gritos. Analisa as causas, oferece sugestões para cada uma destas contradições.
Talvez o ponto mais forte deste capítulo seja o chamado à Conversão Ecológica.
Posto que existe o pecado pessoal, social e estrutural, se diz que a Igreja deve ao mesmo tempo enfrentá-lo... e reconhecê-lo dentro de si mesma.
A raiz deste pecado é desvincular-se da natureza.
O coração da intuição indígena é que não é a terra que nos pertence, mas nós que pertencemos a ela!
Se rompe a aliança que Deus havia tecido com cuidado desde a criação, e que é o coração dos primeiros cinco livros da Bíblia.
Se a raiz é esta, quais os frutos?
- o domínio dos territórios (um novo colonialismo)
- o lucro como medida absoluta e ídolo
- a natureza vista só como recurso (utilitarismo, que justifica o saque)
- a perda da mística, do horizonte transcendente
O que fazer?
Às vezes, ao ver situação tão dramática, estamos obcecados na busca de ações que resolvam.
Consideremos, porém, que pensar é tão importante quanto fazer.
A conversão não é primeiramente uma ação, mas uma mudança de postura, de coração, de pensamento...
Neste mês, convido a pensar nos povos indígenas de uma forma diferente.
Não como diferentes que precisamos integrar ao nosso modo de viver.
Não como pobres que precisamos ajudar (toda vez que separamos o índio de sua terra, o transformamos em pobre, porque o capitalismo precisa de pobres para se alimentar e se justificar, diz Eduardo Viveiro de Castro).
Não como resquício do passado, a ser preservado.
Pensar nos povos indígenas como o novo que nossa sociedade em depressão não consegue ainda enxergar.
O novo que nos ensina o valor das relações, a memória dos ancestrais e a preocupação para com as gerações futuras, o discernimento coletivo e a participação, a pertença à Mãe Terra.
Veja aqui o comentário do padre Dario sobre o primeiro capítulo do instrumento de trabalho para o Sínodo sobre a Amazónia: Voz da Amazónia.