Igreja
09 agosto 2021

Partilhar a vida e a fé

Tempo de leitura: 6 min
A Ir. Isabelle Kahambu Valinande é uma missionária comboniana congolesa que, com alegria e entusiasmo, partilha a sua vida e fé com os povos americanos.
Ir. Isabelle Valinande
Missionária comboniana
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Nasci em Kinshasa (República Democrática do Congo) e, devido ao trabalho do meu pai, passei a infância em diferentes regiões do meu país. Provenho de uma família cristã. O meu pai é engenheiro florestal e a minha mãe é enfermeira, o que nos permitiu ter uma boa educação académica, moral e espiritual. Em casa éramos oito irmãos, sete meninas e um menino, que é o mais novo. O meu pai ultrapassou as barreiras culturais da nossa comunidade e educou-nos a todos com igualdade, com os mesmos direitos e deveres. Por isso, eu tive a possibilidade de ser educada e crescer profissionalmente, uma oportunidade que normalmente é reservada apenas aos homens. 

A alegria de ser missionária

Nunca pensei em ser religiosa. Era a minha irmã Fabiola, a terceira, que tinha esse desejo, mas o meu pai orientou-a e ela começou a estudar e a preparar-se profissionalmente. E, entretanto, encontrou a sua verdadeira vocação, a de ser mãe. Foi sob a influência da minha irmã que comecei a participar no grupo vocacional da minha paróquia. Lá conheci outro jovem, agora missionário comboniano, o padre Gervais Mutsopi, que me convidou para participar num encontro organizado pelas Combonianas de Butembo. 

Aquele encontro vocacional mudou-me a vida. Um missionário congolês contou-nos sobre a vida de São Daniel Comboni. A sua experiência comoveu-me e despertou-me o desejo de querer saber mais sobre aquele homem apaixonado por África que, na altura, era um continente abandonado ao seu destino. Aquele missionário disse-nos que Comboni era o único filho sobrevivente de oito irmãos, os seus pais eram pobres, camponeses e idosos. Apesar disso, aceitou afastar-se dos seus pais para ir evangelizar a África. Em casa, disse a mim mesma: «Se Comboni aceitou deixar o mais valioso que tinha por um povo, pela África, porque não posso eu fazer o mesmo?» Foi aí que ocorreu a minha conversão, a mudança de minha vida.

Fiquei ainda três anos em Butembo a trabalhar e a estudar antes de começar a primeira fase de preparação para a vida comboniana. Fiz, depois, seis anos de formação no instituto das Missionárias Combonianas.

Missionária africana na América

Depois da minha primeira profissão religiosa, que fiz em Namugongo (Uganda), fui destinada ao México. Comecei em Guadalajara, cidade onde passei um ano a trabalhar com idosos e doentes, e também na paróquia.

Depois, em Costa Chica, no Estado de Oaxaca, dediquei dois anos ao trabalho pastoral com a juventude afro-mexicana. Foi uma bela experiência que deu sabor à minha vida missionária: aprendi com os jovens, conheci a realidade desse povo e pude abrir-me ao diferente para poder partilhar a minha vida e cultura. 

A diocese de Puerto Escondido, a que pertence a paróquia de Huaxolotitlán, não tinha agentes pastorais suficientes e contava com poucos padres. A nossa paróquia tinha mais de 32 comunidades e um único padre que não conseguia chegar a todos os lugares durante o ano; as comunidades tiveram de se organizar para celebrar a sua fé. As quatro irmãs dividimos o território da paróquia para acompanhá-las. O testemunho de fé destes povos comoveu-me profundamente.

 

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A Ir. Isabelle Kahambu Valinande durante a procissão de Domingo de Ramos em Costa Chica (México) no ano de 2016 (© Cortesia da Ir. Isabelle Kahambu) 

Esta foi uma realidade que me surpreendeu porque o México é um país com mais de 500 anos de evangelização. Na minha diocese, Butembo-Beni, há muitos padres e congregações religiosas. Apesar de terem transcorrido poucos anos desde a chegada do Evangelho, há agentes pastorais preparados para acompanhar as comunidades cristãs e as celebrações são muito vivas e animadas. Neste contexto, em Costa Chica tive de fazer um pouco de tudo. Aos domingos fui a diferentes comunidades para as celebrações da Palavra, algo novo que não foi fácil para mim, especialmente quando alguma pessoa falecia.

Nos povoados não podem enterrar os seus familiares sem a bênção, por isso procuram um padre, uma freira ou um catequista. Dizem que «estão mais perto de Deus» e que «a oração ou a bênção aproxima os falecidos de Deus». Têm um ritual que mistura tradições africanas e indígenas. Logo que a pessoa morre, colocam-na no chão para estar em contacto com a Mãe Terra. «Da terra vêm e a ela voltam», afirmam. Quando o corpo arrefece, consideram que a Mãe Terra o recebeu. Depois colocam flores de cempasúchil [calêndula asteca] com cal no lugar e põem o falecido numa cama preparada para o velório e, posteriormente, vão para a capela e o funeral. No fim dos rituais, a comunidade reúne-se em torno da comida. As comunidades com as quais trabalhei também têm o hábito de organizar uma novena de oração, para rezar pelo eterno descanso dos falecidos.  Apreciei muito esta forma de celebrar a vida e a morte.

Finalmente, vivi na Cidade do México durante seis anos. Ali, além de estudar Ciências Religiosas, dediquei-me à animação missionária e à pastoral com as pessoas migrantes. Na Casa Mambre ajudei-as com os procedimentos administrativos e a aprendizagem da língua, especialmente aquelas que vieram de África; e no centro Cafemir colaborei no acompanhamento psicoespiritual e em terapias manuais para facilitar a integração social.

Agora estou nos Estados Unidos, onde abrimos uma comunidade no Texas, com a intenção de continuar a trabalhar com os jovens. 

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