Igreja
21 maio 2019

D. António Barroso: Caminhos novos de evangelização

Tempo de leitura: 5 min
D. António Barroso [1854-1918] aliou a acção à reflexão e esboçou a figura do missionário para a África do seu tempo.
Amadeu Gomes de Araújo
Vice-Postulador da Causa de Canonização de D. António Barroso
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O missionário deve levar «em uma das mãos a Cruz, símbolo augusto da paz e da fraternidade dos povos, e na outra a enxada, símbolo do trabalho abençoado por Deus. Deve ser padre e artista, pai e mestre, doutor e homem da terra; deve tão depressa pôr a sua estola, […] como empunhar a picareta para arrotear uma courela de terreno; deve tão depressa fazer uma homilia, como pensar a mão escangalhada pela explosão duma espingarda traiçoeira». Foi nesta linguagem expressiva que o padre António Barroso, ao regressar do Congo, em 7 de Março de 1889, esboçou a figura do missionário para a África do seu tempo. A Cruz associada à enxada. A fé cristã e o desenvolvimento.

Era dotado de um espírito reformador: «É intenção minha reformar todos os serviços», afirmou em Meliapor, no ano em que ali chegou (1898). Aliou a acção à reflexão, foi missionário e missiólogo. O padre António Lourenço Farinha, que foi missionário em Moçambique e historiador, entende que D. António abordou a questão missionária como ninguém até então tinha feito, e refere-se-lhe como «o maior de todos os missionários modernos». O cónego Alcântara Guerreiro, também missionário e historiador de Moçambique, escreve que «o valor da sua obra reside no espírito reformador que a anima». E o académico padre Brásio considera-o um autêntico mestre de missionários, um teorizador da acção missionária, um missiólogo.

Considerava fundamental que os agentes da missão repensassem os seus métodos de trabalho. Entendia que a forma de preparar operários para a messe africana, dotados de uma mentalidade nova, passaria por criar uma instituição diferente do Colégio das Missões Ultramarinas, onde se formara. Falava de uma congregação nova com membros ligados por sólidos laços de solidariedade, com o futuro assegurado em caso de doença ou de velhice e com a continuidade da obra também assegurada. É indispensável – afirmou – que o missionário que trabalha em África saiba que a sua obra não morre, que quando a faina lhe roubar a vida ou o inutilizar para o trabalho, veja chegar os que devem continuar a sua obra de paz e de progresso. Foi o precursor da Sociedade Missionária da Boa Nova.

A partir da sua experiência no Congo, o bispo Barroso passou a prestar particulares cuidados à localização e centralização das missões em Moçambique. Entendia que, por razões de economia e de estratégia, as missões deviam estar organizadas a partir de uma missão central. Esta missão-mãe deveria localizar-se numa zona salubre e dominar uma vasta população, donde fosse possível irradiar, contactar com as povoações circundantes, com as missões sucursais em redor.

Na escolha da localização das missões, sempre prestou atenção às distâncias, de modo que permitissem aos padres visitarem-se e ajudarem-se mutuamente. Para evitar o isolamento, instaurou o regime de comunidades de padres e auxiliares. Com tais medidas, o espírito dos missionários mudou, melhorou significativamente.

Foi notável a lucidez e a determinação de D. António Barroso para restaurar em Angola e em Moçambique o verdadeiro sentido da missionação como evangelização das populações locais, sendo de relevar a atenção que prestava ao ensino e à formação da juventude, o humanismo com que lidava com o homem africano e com que defendia os seus direitos, o valor que atribuía à honradez e ao civismo nas relações comerciais. É notória a importância que passou a atribuir-se às irmãs missionárias e aos irmãos leigos. É notável a valorização que passou a dar-se ao clero autóctone. Neste esforço, foi pioneiro entre o episcopado católico.

 

Publicação conjunta da Missão Press

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