Opinião
21 março 2023

Os pobres numa Igreja sinodal

Tempo de leitura: 3 min
O Papa Francisco anseia por uma Igreja pobre e para os pobres. Eu acrescento: com os pobres, e que a sinodalidade seja sinónimo de fraternidade.
Eugénio Fonseca
Presidente da Confederação Portuguesa do Voluntariado
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(© 123RF)

 

No ano 257, o imperador Valeriano, depois de ter mandado decapitar o Papa Sisto II, intimou a Igreja a entregar, no prazo de três dias, todas as suas riquezas, pois tinha-lhe constado que ela era mais rica que ele. Cumprido o prazo, o diácono Lourenço reuniu todas as pessoas que eram auxiliadas pela Igreja, anotou-lhes os nomes e levou-as ao imperador, gritando a frase que lhe valeu a morte: «Estes são o tesouro da Igreja.»

Está a terminar a fase sinodal do continente europeu. Será que as Igrejas deste Velho Continente podem dizer o que disse o diácono Lourenço ao imperador Valeriano? Com benditas e louváveis excepções protagonizadas por paróquias e congregações religiosas, as Igrejas europeias nunca chegaram a fazer uma sincera «opção preferencial pelos pobres», como o tem vindo a fazer o Magistério da Igreja a partir da III Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano realizada em Puebla, México, no ano de 1979 (cf. Sollicitudo Rei Socialis, 42; Conferência Episcopal Portuguesa, Instrução Pastoral – A Acção Social da Igreja, 9; Evangelii Gaudium, 48 e 198).

Como a realidade que melhor conheço é a de Portugal, gostaria muito que se aproveitasse este desafio do Papa Francisco, de caminharmos juntos, para se fazer, efectivamente, esta opção e «alargar o espaço das tendas» (cf. Is 54,2) das paróquias das nossas dioceses aos pobres e aos mais frágeis do nosso país, sabendo que os de hoje são bem diferentes dos de há duas décadas.

Caminhar juntos com os pobres, salvo mais douta opinião, é: i) assumir, com fé, que eles são sacramento de Cristo e têm igual dignidade humana (cf. Mt 25; Centesimus annus, 28c e 58; Fratelli tutti, 141 e 187); ii) constituir grupos paroquiais de pastoral social que sejam expressão organizada da caridade da comunidade cristã com elementos capazes de ir às causas dos problemas das pessoas; iii) integrar alguns pobres nesses grupos; iv) considerar as instituições sociais como agentes subsidiários e nunca substitutivos da caridade organizada da comunidade cristã (cf. Conferência Episcopal Portuguesa, Instrução Pastoral – A Acção Social da Igreja, 9 e 24); v) criar “bancos de horas” que registem o tempo de quem se disponibilize para apoiar novos projectos de vidas de quem ficou sem trabalho; vi) estabelecer parcerias com outras instituições; vii) realizar assembleias paroquiais anuais para conhecimento da realidade socioeconómica da paróquia; viii) promover acções dirigidas aos pobres em espírito que podem ser os que estão privados de bens materiais e os que não têm falta deles, mas os desperdiçam.

Para que a acção caritativa da Igreja seja anúncio de uma boa nova verdadeiramente libertadora (cf. Lc 4, 18), há que investir mais no conhecimento do pensamento social da Igreja.

O Papa Francisco anseia por uma Igreja pobre e para os pobres. Eu acrescento: com os pobres, e que a sinodalidade seja sinónimo de fraternidade. Quando tal acontecer, ela, então, possuirá tesouros que «a traça e a ferrugem não corroem e onde os ladrões não arrombam nem furtam» (cf. Mt 6, 20).  

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