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18 maio 2024

Os quatro Pentecostes

Tempo de leitura: 8 min
O Pentecostes cristão é o cumprimento e a conclusão do tempo pascal. É a festa do nascimento da Igreja e o início da Missão.
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Hoje a Igreja celebra a grande solenidade do Pentecostes, a festa da descida do Espírito Santo, cinquenta dias depois da Páscoa, segundo a narração dos Actos dos Apóstolos (ver primeira leitura). O Pentecostes, que significa Quinquagésimo (dia), do grego, era uma festa judaica, uma das três festas de peregrinação ao templo de Jerusalém: a Páscoa, o Pentecostes e a Festa das Tendas (a festa das colheitas, no Outono). Trata-se de uma festa agrícola de acção de graças pela colheita dos primeiros frutos, celebrada no 50.º dia após a Páscoa. É também chamada de "Festa das Semanas", devido ao facto de ocorrer sete semanas após a Páscoa. Esta festa agrícola, mais tarde, foi associada também à recordação da entrega da Lei ou Torá por Moisés no Monte Sinai.

O Pentecostes cristão é o cumprimento e a conclusão do tempo pascal. É a nossa Páscoa, a passagem para uma nova condição, já não sob o domínio da Lei, mas do Espírito. É a festa do nascimento da Igreja e o início da Missão.

As leituras da festa apresentam-nos, de facto, quatro vindas do Espírito Santo ou quatro modos diferentes, mas complementares da Sua presença. Eu diria que são quatro "Pentecostes"!

O Pentecostes da Igreja

A primeira leitura (Actos 2,1-11) apresenta-nos uma vinda do Espírito surpreendente, impetuosa e luminosa:
Quando chegou o dia de Pentecostes, os Apóstolos estavam todos reunidos no mesmo lugar. Subitamente, fez se ouvir, vindo do Céu, um rumor semelhante a forte rajada de vento, que encheu toda a casa onde se encontravam. Viram então aparecer uma espécie de línguas de fogo, que se iam dividindo, e poisou uma sobre cada um deles. Todos ficaram cheios do Espírito Santo e começaram a falar outras línguas, conforme o Espírito lhes concedia que se exprimissem.
É uma vinda que suscita espanto e admiração, entusiasmo e euforia, consolação e coragem. É absolutamente gratuita, imprevisível e nunca programável. Trata-se de casos excepcionais. Encontramos alguns deles no livro dos Actos, mas houve-os também na história da Igreja, embora não tão vistosos e imponentes, mas sempre de grande fecundidade. De facto, o Pentecostes é sempre seguido de uma primavera eclesial. Deus sabe como precisamos dela, no inverno eclesial que estamos a atravessar no Ocidente! Só a oração incessante da Igreja, a humilde paciência do semeador e a docilidade ao Espírito podem obter uma tal graça!

O Pentecostes do mundo

A efusão do Espírito estende-se a toda a criação. É Ele "que dá vida e santifica o universo" (Oração Eucarística III). É Ele que "faz entrar o pólen primaveril no seio da história e de todas as coisas" (Ermes Ronchi). Por isso, com o Salmista, invocámos o Pentecostes sobre toda a terra: "Enviai, Senhor, o vosso Espírito e renovai a face da terra." (Salmo 103). Esta deveria ser uma oração típica e habitual do cristão: invocar o Pentecostes sobre o mundo, sobre as dinâmicas que regem a nossa vida social, sobre os acontecimentos da história. Toda a gente se queixa de "como o mundo vai mal!", do "mau espírito" que o anima, mas quantos de nós fazem a "epiclese" (invocação) do Espírito para que Ele desça sobre as pessoas, as situações e os acontecimentos da nossa vida quotidiana? 

O Pentecostes dos dons espirituais, ministérios e carismas

O apóstolo Paulo, na segunda leitura (1 Coríntios 12), chama a nossa atenção para uma outra epifania do Espírito: os dons espirituais e os ministérios. "Em cada um se manifestam os dons do Espírito para o bem comum" Hoje fala-se muito de dons, de carismas, de ministérios e de partilha dos serviços eclesiais, mas há um crescente e preocupante desinteresse das gerações mais jovens. O sacramento da confirmação, o "Pentecostes pessoal", que deveria tornar-se a passagem para a plena participação na vida da Igreja, é infelizmente o momento da deserção. Um sinal claro de que falhámos no nosso objectivo de iniciação cristã. O que é que se deve fazer? A Igreja deverá dotar-se de um "ouvido" extremamente sensível e reforçar as suas "antenas" para perceber a Voz do Espírito neste momento particular da sua história. Atrevo-me a dizer que o problema mais grave é a mediocridade espiritual das nossas comunidades. Preocupados em salvaguardar a ortodoxia e a boa ordem da liturgia, perdemos de vista o essencial: a experiência de fé!

O Pentecostes do domingo

A liturgia propõe-nos de novo o evangelho da aparição de Jesus ressuscitado na tarde de Páscoa (João 20,19-23). Um evangelho cheio de ressonâncias pascais:
Na tarde daquele dia, o primeiro da semana, estando fechadas as portas da casa onde os discípulos se encontravam, com medo dos judeus, veio Jesus, apresentou-Se no meio deles e disse-lhes: «A paz esteja convosco». Dito isto, mostrou-lhes as mãos e o lado. Os discípulos ficaram cheios de alegria ao verem o Senhor.
Jesus disse-lhes de novo: «A paz esteja convosco. Assim como o Pai Me enviou, também Eu vos envio a vós». Dito isto, soprou sobre eles e disse-lhes: «Recebei o Espírito Santo: àqueles a quem perdoardes os pecados ser-lhes-ão perdoados; e àqueles a quem os retiverdes ser-lhes-ão retidos».

Este evangelho é chamado o "pequeno Pentecostes" do evangelho de S. João, porque aqui a Páscoa e o Pentecostes coincidem. O Ressuscitado oferece o Espírito na tarde de Páscoa. Todo este contexto faz pensar na reunião dominical e na Eucaristia. É aí que o Espírito "paira sobre as águas" (Gênesis 1,2) do caos e do medo da morte e traz a paz, a harmonia e a alegria da vida. O papel preeminente do Espírito deve ser redescoberto. Este é o Seu tempo. Sem Ele, não podemos proclamar que "Jesus é o Senhor" (I Coríntios 12,3), nem clamar "Abbá! Pai!" (Gálatas 4,6). Não há Eucaristia sem a intervenção do Espírito. Por isso, entremos na Eucaristia suplicando no nosso coração: Vinde, vinde, Espírito Santo!

Para concluir, como é que navegas no mar da vida: a remos ou à vela?

Respiramos o Espírito Santo. Ele é o oxigénio do cristão. Sem Ele, a vida cristã é lei e dever, é um remar constante, com esforço e cansaço. Com Ele, é a alegria de viver e de amar, é a leveza de navegar à vela. Agora que, depois do tempo pascal, retomamos o tempo comum, com a rotina da vida, como te preparas para navegar: com a força dos remos ou deixando-te levar pelo Vento que sopra na vela desfraldada do teu coração?

P. Manuel João Pereira Correia mccj

 

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